O médico explica como o crack age para
tornar o usuário dependente. “O pulmão tem muitos vasos sanguíneos para
absorver o oxigênio e respiramos 16 segundos para manter o organismo
funcionando. O crack vai com a mesma velocidade do oxigênio para o
cérebro e, rapidamente, o usuário já precisa de outra dose. Fica uma
necessidade vital de consumir a substância. A sensação que eles têm é
como se ficássemos 1 minuto sem respirar. Por isso ficam desesperados.”

Esse desespero faz os viciados se
sujeitarem a tudo para conseguir novas pedras de crack, como relatam
ex-usuárias da droga. “Eu morei na rua por 8 anos e fumei crack por 5. O
pico do prazer durava pouco e eu queria sempre mais. Depois da euforia
vinha uma dor no corpo, estômago, depressão e eu ficava nervosa. Nem me
preocupava com banho ou comida”, conta Fernanda Alves, de 33 anos, que
chegou a abandonar a filha e deixou que a mãe morresse antes de voltar
ao mundo real.
Fernanda saiu de casa aos 15 e buscou
apoio em uma entidade religiosa para se livrar do vício. Atualmente
trabalha para recuperar viciados e se depara com situações em que, por
exemplo, recolhe pedras e cachimbos das mãos de usuários em busca de
tratamento. Ao sentir o cheiro da droga, confessa, tem a sensação de que
fumou no dia anterior.
Experiência parecida foi vivenciada por
Tatiana Gomes Martins, de 25 anos. “Com 11 anos eu saí de casa e aos 12
eu estava no crime, já viciada em maconha e loló (lança-perfume).
Comecei a traficar e um dia resolvi experimentar o crack. Foi eu dar uma
‘lapada’ e acabou a vida”, descreve Tatiana. “Fiquei 6 anos como se
fosse aquele mesmo dia, perdi o sentido da vida. Fui morar na
cracolândia, em São Paulo, e para conseguir mais pedra cometia delitos e
até cheguei a me prostituir”, acrescenta.
Para deixar as drogas, Tatiana contou
com a ajuda da mãe, mudou de cidade, buscou auxílio religioso e também
trabalha para tirar as pessoas da dependência química. “Tenho vontade de
dizer a todos os usuários para acordarem para a vida, enquanto é tempo.
E os pais nunca devem desistir dos filhos. Minha mãe lutou por mim. Ela
acreditava que eu ia mudar”, diz ela, lembrando que o desejo do viciado
de sair das drogas é o primeiro e mais importante passo para a
recuperação.
Fernando Poffo | Arte: Edi Edison
fernando.poffo@folhauniversal.com.br
